sábado, 19 de dezembro de 2009

Uma pequena abordagem sobre o livro de Marcos Bagno "Nada na Língua é por acaso - por uma pedagogia da variação linguística"

NADA NA LÍNGUA É POR ACASO - POR UMA PEDAGOGIA DA VARIAÇÃO LINGÜÍSTICA


Esse maravilhoso livro de Bagno apresenta de modo acessível e esclarecedor, os fundamentos necessários para que professores em atuação e em formação, possam abordar conceitos como variação e mudança, norma-padrão e norma culta, estigma e prestígio, letramento e oralidade - entre outros - de maneira consistente e sem as distorções que, infelizmente, aparecem com tanta freqüência em documentos oficiais, diretrizes curriculares, livros didáticos e, principalmente, nos meios de comunicação, onde imperam noções arcaicas e pré-científicas sobre língua e linguagem que em nada contribuem para a construção de uma democracia lingüística no nosso país.

Como lidar com variações e mudanças da língua no ensino de português? Essa foi a principal questão que Marcos Bagno, professor do departamento de Lingüística da Universidade de Brasília, procurou responder nesse livro para milhares de professores que buscam compreender sua língua materna, visando aperfeiçoar o ensino de língua portuguesa.

Bagno explica que os discursos da ciência e do senso comum a respeito da língua são diferentes. Para as ciências da linguagem, toda manifestação lingüística é correta, se é capaz de cumprir a função de interação humana. Já o senso comum tem arraigada a noção de erro, influência dos primeiros gramáticos, que definiram um modelo de língua baseado no falar de um grupo social específico: homens, livres, letrados, ricos, cidadãos (eleitores e elegíveis) e membros da aristocracia política. Tudo o que fugia a esse modelo idealizado era – e continua sendo – considerado erro. “Se pensarmos dessa forma, vamos dizer que 99% da população fala errado a própria língua”, diz Marcos Bagno.

Na direção contrária à dos primeiros gramáticos, a lingüística propôs, mais tarde, que em vez de pensarmos em “erro”, deveríamos pensar em variação da língua, de acordo com fatores como a região e a classe social de origem dos falantes, e em mudanças lingüísticas, que ocorrem naturalmente ao longo do tempo. Segundo Marcos Bagno, é impossível pesquisar a língua sem levar em conta quem fala, para quem fala, o contexto social dos falantes e a situação de comunicação. Não se deve tratar a língua como “alguma coisa que não nos pertence e que, para piorar, é de difícil acesso”, como consideram a gramática tradicional e o senso comum.

Como ensinar

Diante da idéia de que nada na língua é por acaso, de que todas as formas de expressão verbal têm organização gramatical e de que os supostos “erros”, quando estudados, revelam uma lógica e uma sistematicidade, a pergunta inicial retorna: “Como tratar os fenômenos de variação e mudança no ensino de língua?”. Marcos Bagno afirma que há três possibilidades: a) ignorar as contribuições da lingüística e continuar ensinando a gramática normativa, considerando a norma-padrão como a única forma certa de usar a língua; b) substituir totalmente a antiga noção de “erro” pelos conceitos de variação e mudança; ou c) conciliar as duas perspectivas, em benefício da formação do aluno. Segundo o pesquisador, a terceira opção é a mais adequada porque não negligencia os conhecimentos da lingüística e, ao mesmo tempo, reconhece que a sociedade não é regida pelo discurso científico.

“Os professores de português têm, então, que mostrar que a língua não é neutra, é lugar de conflito. Os alunos têm que saber que sua produção lingüística, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação social, positiva ou negativa”, defende Bagno. Sabendo disso, as pessoas podem até usar variedades lingüísticas não padronizadas, como forma de protesto, como fazem os autores de rap. O pesquisador enfatiza que o importante é oferecer ao aluno o conhecimento de todas as opções possíveis para que ele faça escolha consciente das conseqüências.

Para cumprir essa “missão”, o professor de português precisa ter um embasamento mínimo em sociolingüística que o capacite a perceber os fenômenos lingüísticos que ocorrem em sala de aula e a reconhecer o perfil sociolingüístico de seus alunos. Assim, o educador será capaz de “empreender uma educação em língua materna que leve em conta o grande saber lingüístico prévio dos aprendizes e que possibilite a ampliação incessante do seu repertório verbal e de sua competência comunicativa”, conclui Marcos Bagno.

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